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STJ trata do adimplemento substancial à luz da função social do contrato e do princípio da boa-fé


STJ trata do adimplemento substancial à luz da função social do contrato e do princípio da boa-fé

O instituto do adimplemento social tem como função impedir o uso deliberado do poder de resolução de contrato do devedor, de forma a preservar a avença à luz da função social do contrato e do princípio da boa-fé. Mesmo que não se encontre consolidado em legislação brasileira, o instituto é amplamente aplicado em ações onde a maior parte da obrigação firmada foi cumprida e o inadimplemento residual se deu por motivos excepcionais e imprevisíveis, de forma a impedir o cumprimento imediato do pactuado.


A origem desse instituto se deu no direito Inglês do Século XVIII, sendo posteriormente adotado por países que adequam-se ao civil law, como o Brasil. É importante o reconhecimento de que sua aplicação não se dará em casos onde o devedor deixe de cumprir com suas obrigações por livre e espontânea vontade. Diante dessa questão, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) firmou o entendimento de que o montante que foi pago pelo devedor deve ter alcançado considerável cumprimento da obrigação, para que o credor não seja prejudicado pela aplicação do adimplemento substancial.


No julgamento do REsp 76.362, consolidou-se algumas exigências para a aplicação do instituto, dentre elas: existência de expectativas legítimas geradas pelo comportamento das partes; pequeno valor do pagamento faltante comparado ao total devido; e a possibilidade de conservação da eficácia do negócio jurídico, sem que ocorra prejuízo ao direito do credor de pleitear a quantia devida pelos meios ordinários.


Ainda nesse julgamento, o relator, já falecido, Ministro Ruy Rosado de Aguiar, determinou que a extinção de contrato, no caso de inadimplemento substancial, implica da imprescindibilidade de ação judicial para a resolução. Diante disso, afirmou:


A resolução em juízo, como modo comum para o desfazimento do contrato por incumprimento do devedor, é uma opção do legislador, que entre vantagens e desvantagens, tem o mérito de permitir o exame da validade das cláusulas sobre cumprimento e extinção, providência especialmente necessária quando se cuida de contrato de adesão.

Em outro julgado fundamental para o tema, a Quarta Turma estabeleceu que o conceito de adimplemento substancial não pode ser aplicado aos vínculos jurídicos familiares. Portanto, não é permitido que o instituto resolva litígios de natureza alimentar, sendo negado habeas corpus a devedor de pensão alimentícia que se encontrava em prisão civil após o pagamento parcial da dívida.


A obrigação alimentar diz respeito a bem jurídico indisponível, intimamente ligado à subsistência do alimentando, cuja relevância ensejou fosse incluído como exceção à regra geral que veda a prisão civil por dívida, o que evidencia ter havido ponderação de valores, pelo próprio constituinte originário, acerca de possível conflito com a liberdade de locomoção, outrossim um direito fundamental de estatura constitucional.” avaliou o relator Ministro Antonio Carlos Ferreira.

Adiante, no REsp 1.581.505, o STJ consolidou o entendimento de que o adimplemento substancial não deve ser prestigiado a nível que cause inversão da ordem lógica do integral e regular cumprimento do contrato e o meio esperado de extinção de obrigações. Nessa esteira, o aspecto quantitativo de cumprimento da obrigação nem sempre se fará eficiente, visto que em determinadas situações pode afetar o equilíbrio contratual, de forma a viabilizar ônus considerável ao credor na manutenção do negócio.


O instituto também não será aplicado aos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/1969, conforme julgamento do REsp 1.622.555. Segundo o entendimento do relator, Ministro Marco Buzzi, sua aplicação implicaria na violação do princípio da boa-fé, devido a desproporcionalidade da medida.


Ainda nesse julgamento, o Ministro Marco Aurélio Belizze destacou em seu voto que o Decreto-Lei 911/1969 não traz previsão acerca da ação de busca e apreensão por extensão da mora ou da proporção do inadimplemento. Na realidade, a norma traz a condição da quitação integral como exigência para que o bem alienado fiduciariamente seja restituído livre de ônus ao devedor. Desta forma, afirma:


Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual.

Assim, ao julgar o REsp 1.731.193, a Terceira Turma firmou o entendimento de que a prestação incompleta ou deficitária de serviço apenas configura adimplemento substancial ao adequar-se à necessidade do contratante. Em caso contrário, será instituído o inadimplemento total da obrigação.


Se a prestação realizada sem proveito para o credor em razão do momento em que verificada configura descumprimento da obrigação – isto é, verdadeiro inadimplemento –, da mesma forma, aquela realizada igualmente sem proveito para o credor em razão do modo como executada deve ser também considerada inadimplemento.” afirmou o relator Ministro Moura Ribeiro.

O instituto do adimplemento substancial também tem aplicação no atraso de pagamento de uma das parcelas do seguro-saúde, não podendo a seguradora descumprir sua principal obrigação de indenizar gastos em tratamento do paciente devedor, de acordo com o entendimento fixado no REsp 293.722, com relatoria da Ministra Nancy Andrighi.


A relatora destacou no julgamento, jurisprudência do STJ, no sentido de que o inadimplemento deve ser significativo para que encerre ou suspensa o contrato no escopo da obrigação principal. Nessa linha, afirma:


Tratando-se de contrato de seguro-saúde, em que a indenização pelos gastos com internação constitui-se em obrigação principal da seguradora, o mero atraso no pagamento de uma parcela do prêmio não se equipara ao inadimplemento total do segurado, motivo pelo qual não pode acarretar a desobrigação da outra parte.
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